Como uma das primeiras etapas na elaboração de um projeto arquitetônico, o estudo da legislação vigente no terreno é de suma importância para o êxito da proposta. Por meio de cálculos e restrições, as leis de zoneamento apresentam limites a serem considerados no projeto que, consequentemente, instigam os arquitetos a pensarem em soluções inteligentes, lidando de maneira prática e criativa com tais limitações.
Esses parâmetros são ditados pelo poder público e têm como objetivo frear, manter ou acelerar o crescimento urbano de determinada porção da cidade. São normas que estabelecem diretrizes para a ocupação do solo delimitando a porcentagem de área construída, recuos, afastamentos, permeabilidade do terreno, entre outros.
No caso da taxa de permeabilidade, de maneira geral, aborda-se a capacidade de absorção da água da chuva pelo solo. Ou seja, esse índice representa uma porcentagem em metros quadrados dentro do lote que deve ser mantida livre de edificações, permitindo que a água da chuva possa se infiltrar no solo e atingir o lençol freático. Em grande parte das cidades brasileiras esse percentual está em torno de 15% a 30%, mas há áreas rurais nas quais essa porcentagem chega até 80%.
Garantir a permeabilidade do solo é fundamental para diminuir o impacto provocado pela urbanização na natureza pois criar obstáculos para o escoamento natural da água acaba por favorecer as enchentes. Nesse sentido, cabe ao arquiteto desenhar estratégias que respeitem a legislação e o meio ambiente, mas ao mesmo tempo possibilitem a criação de espaços agradáveis no entorno da edificação, gerando áreas abertas convidativas e acolhedoras. São jardins, pátios ou quintais que compõem funcional e volumetricamente com a edificação.
Dentre as estratégias, a mais óbvia de todas talvez seja a utilização da cobertura vegetal, criando ambientes arborizados e gramados. Entretanto, também podem ser utilizados outros materiais que permitem a absorção da água, mas ao mesmo tempo estimulam diferentes apropriações e usos como os decks de madeira, placas de drenagem, blocos de concreto vazados, blocos intertravados além dos elementos naturais como pedras e seixos.
Na Casa AA, construída no interior de Minas Gerais, por exemplo, além dos espaços gramados, grande parte da externa foi pavimentada com blocos intertravados sem rejunte e com um pequeno espaçamento entre eles, possibilitando a permeabilidade do solo. Nessa linha, a Casa Malha de Tijolos, apesar de estar geograficamente afastada da primeira e implantada em um terreno bem menor, utiliza a mesma estratégia dos blocos intertravados. Por meio dos blocos, ambas as casas aumentam sua área útil criando extensões dos espaços de convívio internos mas garantindo a permeabilidade do solo.
Os decks de madeira sobrepostos ao terreno natural também são elementos interessantes quando a intenção do projeto é criar áreas externas de convívio. A Casa MJA, em Portugal, apresenta uma série de deck soltos no terreno que enaltecem e respeitam o ambiente natural, protegendo o ciclo da água e gerando espaços agradáveis de convivência e circulação.
Há ainda os projetos de escala/terreno maior que misturam diferentes estratégias para manter a permeabilidade do solo, entre eles está a Casa FL que, além dos jardins generosos entre os volumes, também apresenta grande áreas com decks de madeira sem contrapiso e placas de pedras recortadas e posicionadas em meio a grama. Aqui é possível perceber que cada estratégia utilizada na casa possibilita um uso e uma percepção diferente do espaço, enriquecendo a experiência do usuário e seu contato com o meio ambiente.
Outro exemplo que mistura diferentes materiais mantendo a permeabilidade do solo é a Casa Pátio que utiliza não apenas as placas recortadas, mas também blocos de pedra retangulares e pedriscos soltos que delimitam o pátio criando uma cobertura natural que se diferencia das áreas gramadas.
Por fim, vale destacar a utilização dos pisos drenantes como alternativa para manter a permeabilidade do solo, já que, com a avançada tecnologia, algumas marcas são capazes de atingir até 98% de capacidade de drenagem, além de serem uma alternativa antiderrapante e com isolamento térmico. A Casa Da Porta Amarela serve como exemplo da aplicação desse piso na área externa adjacente à piscina.
Com essa gama de técnicas e materiais, manter a permeabilidade do solo ao cumprir com a legislação vigente se torna um interessante exercício que possibilita a criação de diferentes espaços e experiências. Entretanto, apesar de alguns materiais atingirem quase 100% de capacidade de drenagem, é importante ressaltar que nenhum deles pode ser comparado à cobertura vegetal pois as raízes das plantas evitam que a terra ceda mesmo quando o fluxo de água for muito intenso.